Sabias que podes usar a tua ansiedade para descobrir o teu caminho a seguir? Os teus próximos passos a dar?
Estar ansioso(a) e viver em ansiedade são duas coisas distintas. Mas são a mesma emoção, logo têm a mesma origem.
Quando há ansiedade, está a acontecer uma contradição na mente, e esta é sentida no coração.
Este artigo é para falar sobre uma mente ansiosa, uma mente que vive num constante estado de ansiedade, seja ele mais ou menos prolongado.
Mas primeiro vou deixar aqui algumas noções sobre o estar ansioso(a).
Ficamos ansiosos quando há um acontecimento no futuro que é importante para nós, pode ser umas desejadas férias, o encontro com uma pessoa, uma mudança na nossa vida, um tipo de exposição pública, e algo em nós ativa um medo de que possa não acontecer ou do resultado caso aconteça.
Quando há algo que ainda vai acontecer e é importante para nós e não temos nenhum tipo de contradição a respeito nos nossos pensamentos, nós sentimos alegria, entusiasmo, e até euforia, ao pensar nesse acontecimento.
Quando nos sentimos ansiosos(as) é porque há algum tipo de receio.
Mesmo que seja uma coisa certa, há sempre a possibilidade de não acontecer, e a mente em ansiedade está sempre à espera que algo de errado aconteça e nos roube esse momento de alegria.
Se é uma viagem, e que já está paga e tudo tratado e férias do trabalho marcadas, que garantia temos nós que não vamos ficar doentes, ou que não vai haver uma tempestade, ou que não vai haver greve nos aviões?
E quanto mais informação recolhemos sobre coisas que correm mal aos outros, nos noticiários por exemplo, mais "razões" temos para duvidar do nosso resultado.
Uma mente constantemente a duvidar ou a temer o resultado, e que não se permite antecipar com entusiasmo o desconhecido, depressa se torna, por hábito, numa mente ansiosa.
Mas quando adquirimos nós este hábito?
A maioria, infelizmente, já o traz dentro de si desde criança, pois foi lá que aprendeu que nem sempre o resultado prometido e esperado vem até si.
Uma criança que ainda não tem a noção de tempo, nem conhece o caminho, depressa fica ansiosa quando, a cada segundo que passa, o seu destino não chega. E muitas vezes também fica muito ansiosa, e até doente, quando algo importante para ela está para acontecer, como o dia de Natal e aniversário onde vai receber prendas, ou uma viagem muito desejada.
A explicação para isto pode estar no facto de falsas promessas e intenções quebradas serem feitas à criança, quando os pais usam os desejos dos filhos para os convencer a fazer uma tarefa ou a comportar-se de uma certa maneira, e depois não cumprem com a sua palavra, ou então, até tinham intenção de o fazer, mas deixam-se levar pelas suas urgências e faltas de tempo.
Vamos então agora falar sobre a mente ansiosa. Sobre uma pessoa que está a viver num constante estado de ansiedade.
Steven Pressfield escreveu um livro maravilhoso que se chama "The War of Art" - A Guerra da Arte - e que recomendo a toda a gente, especialmente os criativos, que vivem da criação de algum tipo de arte.
No seu livro ele fala como todos nós temos um "diabinho" dentro de nós, ao qual ele chama resistência, e que faz de tudo para sabotar o nosso processo criativo.
Steven Pressfield, como muitos autores e artistas, acredita que a sua arte acontece num processo de inspiração.
Que não é ele que cria os seus textos. Apenas está num estado recetivo a receber as palavras e transfere-as para o papel.
O processo é simples e fácil. O difícil é estar nesse estado recetivo, pois há o tal "diabinho" sempre a encher a nossa mente de desculpas e distrações e outras coisas importantes a fazer primeiro.
Este "diabinho" corresponde a uma ação automática de uma parte do nosso cérebro que está programada para nos proteger de sofrimento.
É uma zona tão pequena quanto o tamanho de uma amêndoa e chama-se amígdala.
Quando há algo que é importante para nós, mas temos crenças que nos fazem duvidar ou ter medo, entramos em modo de sabotagem de nós próprios e das nossas intenções.
Depois de ler o livro, eu também comecei a perceber alguns momentos de autosabotagem na minha vida, e comecei a perceber que muitas vezes quando algo era realmente importante para mim, se por um lado causava um entusiasmo, por outro sentia uma certa ansiedade a aparecer, e era nesses momentos que eu "inventava" tudo e mais alguma coisa para arrastar o começo da ação.
Eu, por exemplo, não gosto nada de fazer a lida da casa e evito ao máximo, mas nesses momentos eu não só fazia o que precisava de ser feito, como voltava a limpar o que já estava limpo, e reorganizava os móveis e as gavetas, e ia por a papelada em ordem, etc, etc.
Começa na minha mente com um, ok vou só lavar a loiça primeiro, porque assim já fica feito e depois posso me dedicar a isto, com o, vou só levar o lixo à rua primeiro, e vou por isto direito, e vou tratar da roupa, e vou separar as roupas que já não uso, e vou dar banho aos cães, e cortar-lhes as unhas ...
De repente tudo surgia como um impulso e até como uma vontade de fazer essas coisas primeiro.
Se antes não gostava de fazer ou era um gastar de tempo com coisas chatas, agora de repente eram coisas que eu tinha gosto de as fazer.
Dava por mim a fazer num dia coisas que talvez fosse fazendo ao longo de dias ou semanas e jamais as faria nesse dia se não fosse aquela outra coisa que eu realmente queria fazer, e que assim, era constantemente adiada para mais tarde, e mais tarde, e muitas vezes até a vontade ir embora ou eu passar a achar que seria má ideia ou um desperdício de tempo.
Arrastamos o começar, porque duvidamos ou temos medo do resultado.
Duvidamos se irá resultar, duvidamos se iremos ser capazes, temos medo de falhar, temos medo de ser bem sucedidos.
No fundo o que acontece, e que ativa este "diabinho", são um conjunto de crenças que temos em nós, quer sobre nós mesmos e o que somos capazes, quer sobre como os outros nos vêm e nos aceitam, quer sobre a situação em si, que são ativadas quando a nossa mente foca a sua atenção no resultado que quer alcançar.
E quanto maior a contradição entre estas duas partes da nossa mente, maior será o estado de ansiedade.
O estado de ansiedade será tanto maior quanto for a distância entre o desejo que nos puxa a ir para um lugar e a crença que nos faz temer que isso não aconteça ou que aconteça.
Viver em ansiedade, no fundo, significa isto: há algo em ti que te quer levar numa direção, mas tu não te permites ir.
O teu "diabinho" entra em ação e faz de tudo para te ocupar e distrair do caminho que tens a seguir. Inclusive com os teus próprios pensamentos!
Pois a função do "diabinho" é distrair a mente com tudo para não ter o agora, a calma e a paz do momento presente, que permite a conexão com o corpo, a claridade de pensamento, e o receber de inspiração.
Para a mente receber inspiração, e o escritor receber as suas palavras, e o músico receber a sua melodia, e o pintor receber as suas cores, e qualquer um de nós receber uma ideia, uma solução, uma resposta, um caminho, a mente precisa de estar recetiva a receber.
E para estar recetiva a receber, ela tem de estar minimamente calma e focada numa só direção.
Se o músico está a compor a sua música, mas a sua mente está em ping-pong entre diferentes assuntos que aconteceram ou que irão acontecer, ele não irá receber a inspiração.
E muito menos se nem sequer parar para realizar a sua arte e deixar-se levar por outras coisas que agora sente o impulso para fazer primeiro.
E se a sua mente entra neste ping-pong físico e/ou mental, é porque o seu "diabinho" o está a tentar impedir de criar a sua arte.
Este "diabinho" entra em ação em muitos artistas no seu início de carreira, porque é quando muitas incertezas e inseguranças se manifestam em si.
Não sabem se irão ter sucesso. Não sabem se irão ser reconhecidos. Não sabem se irão conseguir viver da sua arte. Não sabem se a sua arte irá ser apreciada ou criticada. Não sabem se irão ser amados ou desprezados.
Não sabem também até quando a sua inspiração irá durar e não sabem se irão ser capazes de apresentar uma obra que valha a pena.
O medo do resultado e a incerteza e dúvida, fazem com que o "diabinho" os queira proteger do provável sofrimento e encha as suas mentes de pensamentos que não são mais do que um ato de autosabotagem para a eliminação de um caminho antes mesmo de ser começado a ser percorrido.
Mas como disse antes, este "diabinho" apenas responde a crenças, que são programas auto-definidos na nossa mente.
Estes programas são informação que ficou gravada em nós e que não corresponde à verdade, mas apenas a definições e certezas sobre uma suposta verdade.
Uma criança que ouve em pequena quando está a tentar subir para um banco "tu não consegues". E depois em outras circunstâncias lhe voltam a dizer o mesmo, com palavras ou com ações, quando não a deixam tentar e fazem por ela. E que fica com esta informação gravada na sua mente de "eu não consigo", "eu não sou capaz".
Isto quer dizer que depois em adulto a crença "eu não sou capaz" seja uma verdade?
Não!
Mas a crença está lá, e perante uma situação nova, e que por isso não há prova anterior do ser capaz, o "diabinho" entra em ação e tenta evitar o sofrimento desta pessoa, que iria acontecer com a vergonha do falhar (associado a outras crenças) já que "sabe" que não é capaz.
Sabemos assim então que todas estas distrações são uma intenção do nosso "diabinho" de nos proteger de sofrimento.
Mas esta ação da nossa mente e do nosso cérebro, este "diabinho" que surge em nossa defesa, têm razão de ser?
Se olhamos pelo lado da lógica, têm.
Porque a lógica vai buscar o seu fundamento à crença.
E dependendo das crenças que tens, irás encontrar o fundamento para os medos que tens, e assim têm lógica e razão de ser.
E dependendo das crenças dos que te rodeiam, também irás encontrar fundamento no "diabinho" deles que te tenta proteger e empurrar noutra direção.
Ser forte o suficiente para lutarmos contra o nosso "diabinho", ou até o dos outros, não é fácil, não é nada fácil.
É mais fácil ignorar a voz da inspiração.
É mais fácil ignorar a voz da intuição.
É mais fácil ignorar a voz das nossas intenções pessoais e propósito de vida.
É mais fácil ignorar o que estamos de verdade a sentir ...
É mais fácil, aparentemente, ceder às vontades do "diabinho".
Mas há só um problema.
A voz das nossas intenções pessoais nunca se cala e, por mais que seja ignorada dentro de nós, a cada dia torna-se mais forte e mais "pesada".
E por isso a distância entre esta voz e a voz das nossas crenças cada vez aumenta mais e maior se torna o nosso sofrimento.
Maior se torna a ansiedade, que muitas vezes também passa a depressão.
A solução será então ceder-mos à voz das nossas intenções pessoais.
Que é a voz do nosso propósito, do nosso caminho, e que não é uma voz que vem com as direções de todo o caminho a seguir, mas apenas as direções para este agora, para este momento.
Com a direção para onde nos devemos mover neste preciso momento.
E talvez por isso, esta voz também contribua para ativar a voz das nossas crenças, da lógica, da razão.
Porque esta voz das nossas intenções pessoais nunca nos dá o mapa todo e não nos mostra o destino final. Nem o resultado final.
Não temos assim outra alternativa senão confiar, ter fé, avançar e esperar.
Avançar e receber nova inspiração. Avançar e receber nova direção. E assim irmos construindo o nosso caminho.
Para a mente lógica que gosta de definir metas e objetivos e prever resultados, esta abordagem não a satisfaz.
Mais do que isso. Causa-lhe medo.
A mente lógica gosta de ter o controle das situações e por isso gasta tanto tempo a prever os diferentes resultados possíveis.
Deixar que uma tal de inspiração a guie e confiar que tudo vai correr bem, não é algo que esteja ensinada a fazer.
Mas vamos ver as coisas por estes pontos:
1- Conseguimos realmente ter o controle de qualquer situação?
Podemos imaginar e ponderar e prever, mas quantas vezes imaginamos mil e um cenários possíveis, para depois acontecer alguma coisa que nem nos passou pela cabeça?
E será que toda a gente já não sabe que, achar que tem o controle, seja sobre que situação da vida for, ou sobre si própria, ou sobre os outros, é uma ilusão?
E que na verdade, e bem sabemos, não temos o controle sobre nada, nem sobre nenhum resultado, e que essa é justamente a causa da ansiedade?
Poderá até correr como prevemos antes, é verdade, mas isso é apenas isso, e não um eu previ, logo aconteceu.
2- Se a voz da lógica, que nos quer proteger de um resultado negativo, está condicionada pela informação que ficou gravada na nossa mente, e está, e ainda por cima a maior parte dessa informação foi gravada até aos nossos 7 anos de idade, não estará a voz da lógica limitada no seu pensamento e condicionada a ver apenas um certo tipo de possibilidades?
E por isso incapaz de ver ou imaginar outra realidade ou uma imagem mais completa sobre o que a nossa voz verdadeira tem para nós?
3- Se a voz das nossas intenções pessoais é uma voz de inspiração, e é, e se a inspiração vem de uma energia superior e positiva, e vem, não é lógico pensar que esta voz sabe o que é melhor para nós do que nós próprios?
Podemos então confiar na voz das nossas intenções pessoais? Podemos.
Conseguimos?
Isso já requer, para uns um salto de fé, e para outros um caminho de entendimento sobre como a mente funciona e de onde vêm os nossos pensamentos.
Consegues dar o salto?
Ótimo! :)
Não consegues?
Então tens duas coisas a fazer. Uma é lê o livro que eu te disse, lê novamente este artigo, lê mais artigos e mais livros, aprende mais sobre ti e sobre o poder que este "diabinho" tem sobre ti.
A segunda, pára mais e sente mais.
Presta mais atenção em como te sentes, não na ansiedade que está aí ao flor da pele, mas no que sentes bem lá no fundo.
Presta atenção no que sentes quando pensas em algo que gostavas de fazer e presta atenção nos pensamentos que automaticamente surgem na tua cabeça, e assim irás começar a ter um contacto com as tuas crenças.
Começa também a perguntar-te, "porquê?".
Porque é que eu estou a criar esta situação na minha vida?
Porque é que eu estou a criar estes pensamentos na minha mente?
Porque é que eu estou a decidir fazer todas estas coisas primeiro?
...
O que é que eu estou a impedir-me de fazer?
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